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12 fevereiro, 2011

A Sós Com Mrs. C

Por Cau Alexandre

Em dias de intensa reclamação sobre a solidão que assola todos nós, meros mortais, parece estranho a muitos, que alguns optem e gostem de ficar um tempo a sós consigo mesmo. A meu ver, não seria tão estranho se fosse um hábito e não fosse tão assustador se entregar aos próprios pensamentos.


Bombardeados por novas informações a cada milésimo de segundo, não temos um minuto de paz nem durante uma piscadela. Sabemos das notícias, das fofocas, das novidades, até das ‘velhidades’ que voltaram à tona por causa do novo ângulo de visão do velho descobridor de novas-velhas notícias. E assim vão alimentando-nos de informações necessárias e altamente desnecessárias.

Olhamos o infinito mar azul e tomamos consciência que não há mais barreiras nem horizontes perdidos. O mundo inteiro é logo ali. Fazemos dois milhões de amigos sem sequer sair da sala de estar. Rimos, choramos, consolamos, namoramos, brigamos, reatamos, acompanhamos o nascimento e a morte sem levantarmos da cadeira em frente ao computador e ainda assim, nos sentimos sozinhos, pois a solidão é a ausência das pessoas que gostaríamos que estivessem próximas fisicamente de nós, e notamos que o mesmo meio que nos aproxima, nos joga na cara que estar ao alcance dos olhos não é a mesma coisa que estar ao alcance das mãos.

Sentimos falta, sentimos saudade, sentimos... E nos sentimos só!

Levantamos, então, e vamos à luta. O trânsito, as filas, o barulho de gente viva, rindo, conversando, respirando e nos fazendo sentir parte do organismo social. Vivos! E ainda assim sozinhos. Talvez aí percebamos a mais cruel e dolorosa face da solidão. Estar sozinho mesmo cercado de outras pessoas, pois não importa o quanto façamos e queiramos fazer parte do grupo, a solidão massacra, angustia, sufoca. A solidão é acima de tudo ausência.

E pergunto: E quando sentimos falta de nós mesmos? E quando percebemos que carecemos de um tempo para sentar em silêncio e ficar sozinhos com nossos pensamentos, como nossos sentimentos, sintonizando a nós mesmos em busca de um entendimento interior que muitas vezes nos falta pelo simples desconhecimento de quem somos realmente ou daquilo que realmente sentimos?

De maneira não formal, e não se apegando a sinonímia, isso é solitude. É quando se consegue desligar os sons externos, e não falo só do barulho do trânsito e das crianças pela casa, mas desligar o barulho de tudo que é e sempre será externo a nós, até o pesado som do silêncio da solidão. Desliga-se as ausências, desliga-se as preocupações, deliga-se as ansiedades, deliga-se os aborrecimentos e permanece-se a sós consigo mesmo. Quem sabe ouvindo a música que mais se gosta, escrevendo o que nunca se tem tempo de escrever, contemplando um momento, uma paisagem, ou simplesmente em absoluto e total silêncio. É como montar um pequeno oásis em meio a tamanho deserto social no qual vivemos diariamente.

Solitude é presença, é a intensa e transbordante presença de si mesmo que lhe permite estar preenchido, repleto, reconfortado.

São em momento assim, de solitude, a sós consigo mesmo, que refletimos sobre quem somos, quem queremos ser, nossos gostos, o que nos falta, o que já temos, nossas falhas, nossos progressos e até mesmo retrocessos. É quando sem forçar, vislumbramos a nós mesmos de forma honesta, olhando pra nós mesmos pelo lado que deveria ser o lado que mais gostamos, o lado de dentro. Temos, então, novas perspectivas, uma ampliação de pensamento e da vontade de seguir. E quando optamos pelo ansiado, mas tão difícil, momento de ausência completa de pensamento, somos capazes de nos achar bem lá dentro de nós mesmos, achar quem somos de verdade e desfrutar da mais agradável e reconfortante presença de si mesmo.

Não, não estou falando em ficar dias e dias em estado ‘alfa’. Não estou sugerindo esquecer-se da realidade do trabalho, das ansiedades, das indecisões e correrias. Mas não é justo esquecer-se de quem lhe acompanha todos os dias, o dia todo na lida diária: você mesmo.

Não se sabe ao certo quanto tempo de solitude alguém venha a precisar para sentir-se mais junto de si mesmo. Mas é bem verdade que alguma hora você e eu precisamos parar e marcar aquele encontro gostoso e agradável consigo mesmo.

Até porque, se você consegue ser uma boa companhia pra si mesmo e gosta, será uma companhia agradável para qualquer um, pois ninguém é mais exigente do que cada um consigo mesmo.



copyright©caualexandre2011



Um comentário:

Brisa Nordeste disse...

O excesso de informação nos obriga a duas coisas: usar a lógica e razão que nos é própria, fora disso, um avassalador vazio se forma de discrepâncias comportamentais e valores equivocados, sub-valores, infra-valores, conceitos instáveis.
Se o grande mal do século passado era a solidão, o isolamento, mesmo se estando acompanhado real ou virtualmente, o deste século é a indigência íntima,o abandono de si mesmo. O mundo inteiro está disposto a vender idéias, ídolos, produtos, padrões de beleza, de comportamento. O mundo diz: Me consuma! Indiferente a que, em verdade, ele é que nos consome e some, para ressurgir em outras ondas ciclícas, céleres. Esses tempos levam a práxis do nada em um micro universo de seres humanos robóticos, programados pelo horário do trabalho e da TV, fazedores de coisas pelo instinto da auto preservação. Sob este prisma, não podemos nos dar ao desfrute ingênuo da lógica e da razão desta colônia de informações tão rápidas quanto descartáveis. Mas, podemos nos dar ao luxo de desfrutar de nós mesmos, sem avareza e sem ruídos na comunicação e isto, nada tem a ver com egoísmo, com não desejar se sentir a metamorfose de um carrinho de compras de coisas, pessoas e ideias. Você descobriu e eu, através de você, que tem a ver com SOLITUDE.

Gostei muitíssimo do texto.

Dois grandes beijos nos dois átrios!